Avanços e desafios do Acordo UE-Mercosul: a importância estratégica contra o isolamento
- Renata Bueno

- há 4 dias
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Por Renata Bueno, ex-parlamentar italiana e advogadaintrnacional
Na última segunda-feira, 8 de dezembro, o presidente do Conselho Europeu, António Costa, lançou um alerta que ressoa como um chamado à ação para toda a Europa: se a União Europeia não assinar o acordo de livre comércio com o Mercosul, arriscamos ficar "sozinhos no mundo". Essas palavras, proferidas no Congresso Anual do Instituto Jacques Delors, em Paris, um think tank de prestígio que tanto admiro por seu compromisso com o futuro europeu, não são apenas uma opinião isolada. Elas são um diagnóstico preciso de um momento crítico para o bloco que ajudei a representar como ex-parlamentar italiana na Câmara dos Deputados.

Como advogada especializada em Direito Internacional e cidadã ítalo-brasileira, que constrói pontes cotidianas entre a Itália, o Brasil e a Europa através de minhas iniciativas empresariais e do Instituto Cidadania Italiana, vejo nesse acordo uma oportunidade imperdível. A UE, que tanto lutou para se afirmar como potência econômica e política, não pode se dar ao luxo de se retrair em tempos de multipolaridade global. Costa foi categórico: "A UE não existirá no mundo se não for uma potência comercial e não for capaz de estipular acordos". E ele acrescentou, com a clareza que a França, terra de anfitriões deste evento, tanto valoriza: "Eu gostaria de dizer isso claramente agora que estou na França".
O contexto é de reta final. Após anos de negociações, o tratado está a um passo da assinatura, com o Brasil exercendo a presidência pro tempore do Mercosul e apostando em um desfecho ainda este mês de dezembro. Para as empresas europeias, isso significa acesso ampliado a um mercado de 300 milhões de consumidores na América do Sul, com potencial para impulsionar exportações, inovação e sustentabilidade. Imagine as indústrias italianas do agroalimentar ao automotivo – ganhando terreno em solos férteis como os do Brasil, onde a produção de queijos artesanais e vinhos encontra paralelos com nossas tradições mediterrâneas. Como empreendedora no setor de mozzarellas e derivados lácteos, vejo diretamente como esse fluxo comercial pode enriquecer ambas as margens do Atlântico.
No entanto, não ignoro as resistências internas. A França, voz mais veemente contra o acordo, temia, com razão inicial os impactos no seu setor agropecuário, pilar de sua identidade rural e econômica. Os camponeses gauleses, guardiões de terroirs únicos, não querem ver seus mercados inundados por produtos sul-americanos sem padrões equivalentes. Mas Bruxelas ouviu esses clamores. Nos últimos meses, garantias robustas foram apresentadas: cláusulas de salvaguarda para proteger a agricultura europeia, compromissos ambientais alinhados ao Acordo de Paris e mecanismos de cooperação para elevar os padrões sanitários no Mercosul. O presidente Emmanuel Macron, pragmático como sempre, parece ter suavizado sua posição, reconhecendo que o isolamento não é uma opção viável em um mundo onde China e Estados Unidos tecem redes comerciais globais.
Como ex-parlamentar que navegou pelos corredores do Parlamento Europeu em Bruxelas, lembro-me vividamente das batalhas por acordos semelhantes, como o com o Canadá (CETA) ou o Japão. Cada um deles exigiu concessões, mas todos fortaleceram a UE como ator global. O Mercosul não é diferente: ele representa não só comércio, mas laços culturais e humanos. Para mim, que defendo os direitos das mulheres e a cidadania ítalo-brasileira, esse pacto é uma ponte para a diversidade, trocando não apenas bens, mas ideias, tecnologias e valores democráticos.
Se a UE recuar agora, não seremos apenas "sozinhos no mundo", como alerta Costa. Seremos irrelevantes. Perderemos influência na América do Sul para potências emergentes e veremos nossas PMEs, o coração pulsante da economia europeia, sufocadas por barreiras tarifárias obsoletas. O Brasil, com sua economia resiliente e compromisso com a transição verde, é um parceiro estratégico que não podemos desprezar.
Apelo, pois, aos líderes europeus: assinem o acordo. Façam-no com olhos abertos para as salvaguardas necessárias, mas com o coração voltado para o futuro. Como brasileira de nascimento e italiana de alma, sei que as melhores uniões nascem da coragem de se conectar. Que dezembro de 2025 marque não o fim de uma negociação, mas o início de uma era de prosperidade compartilhada entre a Europa e o Mercosul.













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