O Deus que nos encontra
- Christina Faggion Vinholo
- há 6 horas
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Christina Faggion Vinholo, teóloga, especialista em AT e NT.
Desde os primeiros capítulos da Escritura, vemos um Deus que toma a iniciativa. Quando Adão e Eva pecaram e se esconderam, não foram eles que procuraram o Senhor — foi Deus quem os buscou no jardim. “Onde estás?” não é apenas uma pergunta, mas um chamado amoroso do Criador ao coração do ser humano caído. Essa é a marca de toda a narrativa bíblica: um Deus que encontra, que se revela, que intervém.

Não somos nós que encontramos Deus; Ele é quem nos encontra. A salvação nunca foi fruto da vontade humana, mas da graça soberana. Abraão não estava à procura de um Deus verdadeiro entre os muitos de sua terra — foi Deus quem o chamou do meio da idolatria e o conduziu por uma nova estrada de fé. Jacó, ainda fugindo de seu passado e carregado de culpa, teve um encontro com Deus no deserto, quando dormia com uma pedra por travesseiro. A escada que ligava céu e terra não era uma construção humana, mas uma visão de que o caminho entre Deus e o homem parte sempre do alto para baixo.
Moisés estava escondido, cuidando de ovelhas no deserto, longe de qualquer missão espiritual. Mas Deus o encontrou na sarça ardente, revelando seu nome, sua santidade e seu plano redentor. Gideão estava malhando trigo escondido do inimigo quando foi surpreendido pelo anjo do Senhor. Davi estava no campo, esquecido até mesmo por seu pai, quando Deus o escolheu como rei. Jonas tentou fugir, mas Deus o alcançou mesmo no ventre do grande peixe. E os discípulos de Jesus foram chamados no cotidiano: pescando, cobrando impostos, caminhando.
Esse movimento de Deus em direção ao homem alcança seu clímax na encarnação. Em Cristo, Deus não apenas nos encontra — Ele se faz um de nós. Ele anda entre nós, toca o leproso, chama os pecadores, come com os rejeitados, e transforma corações. A mulher samaritana foi ao poço buscar água, mas encontrou Aquele que é a fonte da vida. Zaqueu subiu em uma árvore para ver Jesus, mas foi Jesus quem o viu e disse: “Hoje me convém pousar em tua casa.” E Saulo de Tarso, respirando ameaças e ódio, foi interrompido por uma luz do céu e uma voz que o chamou pelo nome.
A doutrina da eleição, tão cara à fé reformada, nos lembra que esse Deus que nos encontra o faz por amor eterno e não por méritos. Ele nos escolheu antes da fundação do mundo, nos chamou eficazmente, e nos regenerou pelo Espírito. Não é que estávamos procurando por Ele com sinceridade — estávamos mortos em nossos delitos e pecados. Mas Ele nos vivificou. Ele nos encontrou.
Hoje, continuamos sendo encontrados por esse Deus. A narrativa das Escrituras não está encerrada em tempos antigos — ela continua se desenrolando nas nossas vidas. O mesmo Deus que encontrou Moisés no deserto e Maria no meio de suas tarefas diárias continua nos encontrando em nossos próprios desertos e rotinas comuns. Ele nos encontra quando estamos quebrados, sobrecarregados, distraídos ou mesmo indiferentes. A graça que alcançou pecadores no passado é a mesma que nos alcança hoje, porque Deus não muda — Ele é imutável em Seu amor, em Sua misericórdia e em Seus propósitos.
Ele nos encontra quando pensamos estar escondidos — em pecados não confessados, em hábitos que envergonham, em culpas que tentamos calar. Nos momentos em que não conseguimos orar, quando a Palavra parece distante, quando a igreja parece apenas mais um compromisso… ali Ele nos encontra. E não com reprovação seca, mas com a ternura de quem chama pelo nome, como chamou Samuel naquela noite silenciosa, ou como chamou Marta para olhar para além do serviço e contemplar a presença.
Deus também nos encontra nas alegrias cotidianas — na simplicidade de um almoço em família, em uma conversa que nos confronta com a verdade, na leitura de um texto que parece ter sido escrito exatamente para aquele momento da nossa vida. Ele se revela no ordinário, porque a encarnação nos ensinou que o sagrado se manifesta no comum. O Deus que fez morada entre nós continua presente por meio de Seu Espírito, e é Ele quem desperta o nosso coração, nos convence do pecado, nos consola na aflição e nos fortalece para viver com fidelidade.
Quando pensamos que já O conhecemos, Ele nos encontra de novo, desvelando algo mais profundo de Seu caráter, chamando-nos para mais perto, revelando nossas idolatrias escondidas, curando feridas antigas, e realinhando nosso coração à Sua vontade.
Ele também nos encontra por meio da comunidade da fé. Uma palavra dita por um irmão, um louvor cantado pela congregação, uma pregação que penetra até a divisão da alma e do espírito — tudo isso são meios pelos quais o Deus vivo nos alcança. Os meios de graça não são apenas ferramentas litúrgicas, mas manifestações contínuas do Deus que vem até nós.
Ser encontrado por Deus não é um evento isolado. É um processo contínuo de sermos moldados à imagem de Cristo. A cada encontro, somos mais despertos, mais limpos, mais livres. E mesmo nos dias em que parecemos estar andando por fé e não por vista, mesmo quando as orações parecem ecoar no silêncio, é Ele quem está nos sustentando, pois é impossível que aqueles que foram encontrados por Deus estejam, de fato, sozinhos.
O Deus que nos encontra não apenas nos acha — Ele nos transforma, caminha conosco e nos conduz até o fim. E um dia, quando tudo for revelado plenamente, veremos com clareza o quanto fomos encontrados, momento após momento, pela graça irresistível do nosso Senhor.
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