Decifrando o 8 de janeiro. Capítulo 5; lições históricas.
- Walber Guimarães Junior

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Por Walber Guimarães Junior, engenheiro e comunicador.
Percorridas quatro etapas, nas quais tive a honrosa companhia de alguns de vocês, é importante fechar a descrição com as conclusões e observações importantes para que a nação possa curar suas feridas, entender suas mazelas e, principalmente, extrair lições que nos livrem de novas ameaças à nossa democracia e nos livrem do triste passado de impunidade que sempre caracterizou estes acontecimentos.

Cronologicamente, o 8 de janeiro se situa entre a invasão do Capitólio, uma triste página da história política americana, onde o judiciário se curvou às determinações das urnas, bateu continência para o poder constituído e fez vistas grossas ao estímulo criminoso do atual presidente à incisiva tentativa de impedir a certificação dos resultados eleitorais onde o democrata Joe Biden derrotou Donald Trump, e da condenação, agora em novembro de 2025, do ex-presidente peruano Martim Vizcarra a catorze anos de reclusão por corrupção, além da condenação anterior, ainda em junho deste ano, da ex-presidente da Argentina Cristina Kirchner também por corrupção, muito diferente da histórica reincidência de golpes, ou apenas tentativas e embora esses casos sejam de corrupção, sempre impunes, que marcam a América Latina com o triste apelido de continente das repúblicas de banana, onde realmente bastavam um cabo e um soldado para alterar os rumos do poder.
Talvez o julgamento da tentativa de golpe brasileiro seja realmente um estímulo para que a impunidade não seja mais a regra nestes casos, como demonstra o próprio exemplo brasileiro, onde jamais se condenou ninguém, estabelecendo outro padrão onde as balas e deportações não sejam as únicas respostas. A maturidade das instituições brasileiras se consolida como referência até para a principal democracia do mundo, os EUA, que preferiu se curvar às conveniências.
Lógico que as discussões sobre o julgamento brasileiro seguirão por muito tempo, ao sabor das paixões e até das dúvidas persistentes que impedem a amarração de alguns pontos, todavia até o fato do debate político estar se deslocando para a justa revisão da dosimetria, se afastando da fisiológica luta pela anistia, indica que gradativamente a sociedade brasileira vai entendendo que, a despeito da insistente desconfiança com um STF politizado, o conjunto de fatos comprovados ao longo das investigações, com a eloquente escalada de evidências no ano anterior ao episódio, testemunhados pela nação inteira, exigiria realmente reação que desestimule novos atentados.
É justo supor que o ex-presidente não merecia pena tão severa, pela falta de prova contundente de seu envolvimento direto no 8 de janeiro e nas tratativas do golpe, mas resta inquestionável seu conhecimento, discussão e, no mínimo, omissão criminosa contra o desenho de um atentado à nossa democracia, mesmo investido da posição de chefe de estado. Exceto os apaixonados e cegos pela implacável ação dos algoritmos eficazes que corroem tecidos cerebrais estabelecendo links inimagináveis entre a realidade e o desejo, não dá para negar que a alta cúpula do governo anterior esteve fortemente envolvida no debate e construção de caminhos que levassem à reversão da sentença das urnas.
Enfatizando a leitura pessoal, estou entre aqueles que tentam enxergar os fatos sem as lentes ideológicas que interferem na visão de muitos, e considero que a punição do ex-presidente deveria ser ainda mais implacável na esfera política, com o banimento eterno de seus direitos eleitorais, por falta de compromisso democrático, mas muito mais branda na área penal por entender que vinte e sete anos são exagerados, ainda que impostos pela tradução do código penal, a ser interpretado e não desvirtuado pelos ministros. A revisão das penas é quase consenso na sociedade, todavia até falar em anistia é um desrespeito inaceitável porque a impunidade não pode continuar sendo a marca registrada da nossa história política.
Julgo ainda fundamental um debate isento de radicalismo da eficiência das nossas urnas eletrônicas. Definitivamente não me coloco ao lado do debate insano sobre manipulação de resultados, de resto rechaçada por todas as perícias, de diversas fontes, mas impregnado no imaginário popular. Muito provavelmente, teremos centenas de outros pleitos decididos por margens exíguas e parece muito razoável que se adotem medidas par aumentar o nível de confiança do eleitor no resultado das urnas, algo que se pode obter com um esforço menor, e financeiramente acessível, através da implantação de conferência por amostragem, de forma segura, garantindo a inviolabilidade do voto, e permitindo um incremento significativo na confiabilidade das urnas.
Acredito que, às vésperas de um novo processo eleitoral, esteja cada vez mais evidente a necessidade de revisão de nosso modelo político. Pessoalmente, tenho repetido à exaustão que nem mesmo Jesus Cristo, eleito presidente do Brasil, conseguiria impor suas diretrizes pelo conjunto de regras que não mais entregam um equilíbrio, mas a submissão do presidente, seja qual for, ao jogo de interesses de um grupo suprapartidário de parlamentares, profissionais na interpretação das possibilidades que, agora já sem muitos escrúpulos, pressiona, talvez chantageia defina melhor, o chefe do executivo a cada projeto e cobra caro, sempre com a liquidez das emendas secretas, enxugando ferozmente nossa capacidade de investimento no enfrentamento das limitações do nosso desenvolvimento.
Restam dois caminhos; a revisão do sistema eleitoral, impedindo a eternização dos donos das legendas no Congresso, com regras mais democráticas, talvez o distrital misto, porém sem listas, ou apenas a aplicação mínima de transparência e teto decente dos escandalosos volumes de recursos que transformaram nossos legisladores em patrões de obras pelo Brasil. Detesto generalizações, e seria injusta pelo expressivo número de parlamentares éticos e decentes, todavia a resultante, fruto da maioria extremamente competente e “profissional”, o Congresso faz mau ao país e precisa da interferência social para evitar a sangria desastrosa que promovem através do achaque ao presidente de plantão.
Em relação ao STF, que cumpriu seu papel constitucional de preservar a democracia, a despeito dos excessos e politização excessiva, o combate aos nomes é infrutífero porque, ao fim de seu tempo, serão substituídos pelo mesmo processo e nisto deve se concentrar os esforços da sociedade. A revisão da forma de nomeação, impedido que seja um cabide de luxo no closet especial da presidência, por um sistema moderno de construção de uma lista tríplice por meritocracia, neste caso sem nenhum demérito se a palavra final couber ao presidente, com a devida sabatina do Senado.
Consciente que o 8 de janeiro não foi um “domingo no parque”, muito menos um desfile de velhinhos inocentes e seus netinhos, mas uma ardilosa trama que se valeu da fé de inocentes úteis para cumprir mais uma etapa de planejamento detalhado que visava comprometer a nossa democracia, muito mas que a verbalização de protestos estéreis, porque comprometidos pela paixão e cegueira que a polarização causa, que pode ter cometido excessos e estar impregnado de leituras politizadas, mas foi uma etapa necessária para fortalecimento da nossa democracia, como afirmação definitiva que esta questão jamais deverá ser de novo ameaçada, nos resta seguir em frente, com uma nova mentalidade.
Vamos às urnas em 2026, de novo com o eleitorado com a ideia fixa de buscar o salvador da pátria ou simplesmente se ver constrangido na escolha do menos ruim, tentando evitar um resultado ainda pior, mas já é hora de e assumir uma postura mais consequente de cobranças de projetos e planos que alavanquem o Brasil da forma necessária.
O caudilhismo tupiniquim, onde a personalidade afirma “la garantia soy jo”, como nas jocosas propagandas espanholas, não pode ser a senha que nos leve às urnas. Somos melhores, merecemos muito mais que isto.
De novo falando apenas por mim, estou decepcionado e pronto para buscar alternativas à disputa polarizada e personalista, onde narrativas valem mais que ideias, onde nomes superam partidos ou grupos, onde a parcela racional da sociedade é sobrepujada pela imensa maioria de eleitores com limitada cultura política que, em última análise, talvez nos ajude a entender porque tantos ex-presidentes precisam enfrentar tribunais e grades da prisão por descompromisso com a população e apego excessivo ao poder.
Não perco a esperança, talvez ciente que “navegar é preciso, viver não é preciso”, do histórico general romano Pompeu, precise se reeditada porque agora “votar é preciso, mas se apaixonar por políticos não é preciso”.













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