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O CONCLAVE QUE SE APROXIMA...

Por Célio Juvenal Costa, professor da UEM 


Li há muito tempo que um dos desejos de Jorge Amado era ser cardeal. Confesso que é um desejo meu também. Mas, assim como imagino qual era o motivo, não sei se real, de um dos escritores brasileiros que mais vendeu livros, o meu sempre foi o de participar de um conclave da Igreja Católica, pois até hoje a escolha de um papa é sempre cercada de muito segredo, instigando ainda mais a curiosidade geral. Daqui uns dias teremos mais um conclave, o terceiro deste milênio, e é claro, as especulações estão cada vez maiores em torno do sucessor de Francisco no trono de São Pedro. Aliás, pela grandiosidade do funeral do Papa Francisco, pelas inúmeras e variadas demonstrações de carinho e respeito a ele, o peso da escolha do próximo papa parece ter aumentado.

De fato, a Igreja Católica vai, de certa forma, decidir seu futuro próximo no conclave. Ela tem pela frente a escolha entre continuar o que Francisco começou, ou dar um passo atrás, ou, ainda, procurar ir além. Nome de cardeais com os três perfis aparecem toda hora em sites especializados nas questões vaticanas e, portanto, despontam como favoritos. Mas, para quem procura acompanhar mais de perto esses momentos, sabe que normalmente os favoritos não vencem. De qualquer forma, parece ser consenso que a Igreja precisa continuar dialogando com os tempos atuais, para não correr o risco de perder mais fiéis do que vem perdendo nas últimas décadas. Karl Marx já escreveu que as duas instituições sociais que mais demoram para se ajustar às novas configurações da sociedade são o Direito e a Religião. Assim, por mais que muitas vozes, especialmente nos últimos dias, se elevem pedindo ou esperando que a Igreja Romana dê continuidade ao que fez Francisco, não há, de fato, garantia de que isso ocorra.

 

Das muitas coisas que Francisco fez em seus doze anos de pontificado, talvez o mais importante em termos eclesiológicos foi tentar implantar a ideia de uma Igreja sinodal, ou seja, dar uma importância maior para os espaços coletivos, com a participação de pessoas de fora do clero, nas decisões e rumos da Igreja. Durante seu papado, Francisco realizou quatro sínodos, o último iniciou em 2021 e terminou em 2024, e em 2019 houve o Sínodo da Amazônia, que procurou discutir mais fortemente as questões ambientais no planeta a partir da realidade pan-amazônica. Enfim, Francisco procurou que se implantasse na Igreja o espírito da Sinodalidade, em que os bispos, assessorados por padres, freiras, leigos e leigas refletissem em conjunto os desafios atuais e uma nova forma de ser da Igreja. Na prática, a ideia da sinodalidade representa uma instituição menos centralizada e mais com ares democráticos. A democracia é, dentre tantas definições possíveis, a arte de chegar a um consenso em meio ao dissenso, pelo convencimento pelas palavras e argumentos, e não pela imposição de alguém ou de um pequeno grupo.

 

É relativamente comum se encontrar justificativas da longevidade da Igreja Católica no fato de que ela soube se atualizar em sua existência histórica. Talvez os dois concílios tidos como dos mais importantes em sua história podem exemplificar esta teoria. Trento, no século XVI, e o Vaticano II, no século XX, reformaram a forma de ser da Igreja, ou sua pastoral, ao procurarem evitar erros de que era acusada e se aproximar mais dos fiéis. O Concílio Vaticano II, de 1962 a 1965, foi o ponto de partida para várias mudanças, como, por exemplo, a missa passou a ser rezada no idioma local, o padre deixou de ficar de costas para os fiéis na igreja, os leigos foram incentivados a ler e interpretar a Bíblia. A partir dele, outras novidades passaram a fazer parte da rotina da Igreja, como os ministérios leigos, as pastorais, os conselhos administrativos das paróquias. Também como repercussão das decisões do Vaticano II, foram fortalecidas instâncias antes inexistentes no Código de Direito Canônico, como o Conselho Episcopal Latino-Americano e Caribenho (CELAM) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que passaram a orientar, por meio de suas assembleias, a Igreja na América Latina e no Brasil. E, também, como repercussão do mesmo concílio foram criadas a Teologia da Libertação e as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Mas, eu analiso que o Vaticano II só teve, de fato, sua continuidade, que repercute até hoje, porque o Papa Paulo VI, que comandou a Igreja de 1963 a 1978, deu continuidade às ideias de seu antecessor João XXIII, que morreu no meio do concílio. Se o conclave que o elegeu tivesse escolhido um papa mais conservador é bem possível que o concílio perdesse sua força e vitalidade.

 

É neste ponto que quero chegar com meu texto de hoje, pois a continuidade de uma Igreja sinodal, menos monárquica, que se coloque mais acolhedora dos pobres, dos divorciados, das mulheres e dos gays, enfim, acolhedora daqueles e daquelas que são marginalizados, excluídos e sofrem violência na sociedade atual, depende muito do perfil do próximo pontífice. A sociedade global hoje parece dividida em pelo menos duas grandes formas de ver o mundo e as pessoas: uma mais democrática, com espírito republicano, que busca a igualdade de oportunidades para as pessoas, que busca a igualdade de gênero, de raça, de credo, que busca a responsabilidade ambiental; e, outra, mais ditatorial, mais impositiva, mais conservadora, que defende a família tradicional, que vê no diferente um empecilho, um problema a ser combatido e, de preferência, erradicado. No fundo, e é isso que eu defendo aqui, a Igreja vai acabar optando por uma dessas duas formas sociais e políticas de ver e estar no mundo. O tradicionalismo hoje representa a volta de uma Igreja mais clericalizada, mais centrada em si mesma, mais apegada ao ritualismo; a herança de Francisco aponta em uma direção diferente, e é isto que esperamos que o Colégio Cardinalício defina na escolha do próximo papa.

 

Para terminar, gostaria de deixar aqui meu palpite de qual cardeal será eleito nos próximos dias. Antes de apontar um nome, minha impressão é de que o próximo papa será um cardeal italiano, pois, depois de um polonês, um alemão e um argentino, parece que está na hora do sumo pontífice, com habilidades diplomáticas, voltar a ser da Península Itálica. Assim, se eu estiver certo quanto à origem, minha aposta recai sobre Matteo Zuppi, Arcebispo de Bolonha desde 2015 e cardeal desde 2019, que é um dos nomes mais cotados e tem muitas qualidades para continuar o diálogo da Igreja com o mundo atual e todas as suas demandas de inclusão.

 

 

Meu Instagram: @costajuvenalcelio

 

1 comentario


Invitado
01 may

Parabéns pelo texto e torço para que suas impressões estejam corretas. Eu diria que seria muito constrangedor para o próximo Papa negar o legado de Francisco.

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