Maternidade sem filtro: dádiva divina, sem romantismo
- Christina Faggion Vinholo
- 2 de set.
- 3 min de leitura
Christina Faggion Vinholo
Teóloga, especialista em AT e NT.
Ser mãe é dom de Deus, mas não um conto de fadas. Entre lágrimas e bênçãos, há realidades que precisam ser ditas — com ternura e verdade.
Vivemos em tempos em que a imagem vale mais do que a realidade. Redes sociais nos mostram versões suaves, organizadas e quase mágicas da maternidade: bebês dormindo em quartos neutros e minimalistas, mães sorridentes no puerpério, partos registrados com trilha sonora e luz ambiente. Mas, por trás dessas imagens encantadas, a maternidade real — aquela vivida de verdade — grita por espaço.

É verdade: ser mãe é uma dádiva. É um dom precioso concedido por Deus. Mas, como tudo neste mundo pós-queda, está marcada por dor, cansaço e limites. O que antes era vivido com simplicidade e até certo isolamento, hoje está envolto por expectativas e pressões que vão muito além do instinto materno.
O romantismo que adoece
A romantização da maternidade não começou agora, mas ganhou força com o crescimento das redes sociais. Amamentar passou a ser retratado como um momento exclusivamente doce, ignorando as dores, rachaduras, inseguranças. O parto normal virou símbolo de sucesso — e o cesariano, muitas vezes, de fracasso. Como se o nascimento de um filho pudesse ser medido por métodos ou estéticas.
Hoje, há uma valorização quase ideológica do chamado “parto humanizado”. Embora seja uma importante resposta a décadas de violência obstétrica, em alguns contextos ele se torna um novo padrão exigente, quase inatingível. A mulher que não tem recursos para pagar por doulas, banheiras, fotógrafos e uma equipe personalizada pode se sentir menos mãe, ou até mesmo culpada por não ter vivido “a experiência ideal”.
Mas quem disse que parir em uma sala fria, cercada de máscaras e bisturis, é menos humano? Quantas cesarianas — programadas ou de emergência — salvaram mães e bebês? Quantas foram respostas de sabedoria médica e cuidado? A cesárea tem seus riscos, claro, como toda cirurgia, mas também é instrumento de graça e preservação da vida. E muitas mulheres, especialmente no Brasil, não escolhem: são submetidas por protocolos, condições de saúde ou urgências que fogem ao seu controle. Isso também é ser mãe. Isso também é amor.
As novas (e velhas) pressões
A maternidade contemporânea não carrega apenas o peso do cuidado físico, mas uma carga mental quase insuportável. Além de cuidar do bebê, a mulher sente que precisa manter a casa em ordem, ser esposa presente, voltar ao corpo de antes, retomar a carreira — e, de preferência, fazer tudo isso sem reclamar.
Aquelas que têm rede de apoio vivem com um pouco mais de fôlego, mas também enfrentam desafios. A babá pode adoecer, a avó envelhece, a escola fecha, os planos mudam. E o caos se instala com rapidez.
Essa exigência de perfeição está adoecendo mulheres. A comparação constante, a necessidade de provar valor, a sensação de que nunca é suficiente… Isso não é maternidade saudável. É culpa disfarçada de motivação. É escravidão moderna, embalada em discursos de empoderamento.
A verdade com ternura
Não há romantismo no texto bíblico quando Deus anuncia à mulher, após o pecado original: “multiplicarei grandemente o seu sofrimento na gravidez; com dor você dará à luz filhos” (Gênesis 3:16). A maternidade foi tocada pela queda. Ela continua sendo dom, mas agora é dom marcado pela cruz.
E é aí que reside sua beleza mais profunda. Ser mãe é abrir mão. É amar até se esvaziar. É muitas vezes sofrer calada. É carregar cicatrizes visíveis e invisíveis. Mas também é experimentar o milagre da vida, do crescimento, do vínculo eterno.
Por isso, mãe, você que me lê: não precisa ser perfeita. Não precisa dar conta de tudo. Você não precisa caber no molde das redes sociais, nem seguir o script de gurus maternos. Você precisa apenas ser você — com graça, com verdade, com dependência de Deus. A maternidade que você vive, entre choros e alegrias, é válida, digna, sagrada.
Deus vê. Ele conhece seu cansaço, suas renúncias silenciosas, suas lágrimas na madrugada. Ele está com você. E na sua fraqueza, o poder d’Ele se aperfeiçoa.
Ser mãe é bênção, mas não é mágica. Não é conto de fadas. É jornada real. E, justamente por isso, profundamente divina.
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