Do Éden ao Congresso: a teologia do domínio e a busca pelo poder cristão
- Gedeon Lidório
- há 3 dias
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Parte 4
A expansão da Teologia do Domínio, especialmente em sua forma mais ativista e politicamente orientada, acendeu alertas em vários setores da teologia e da sociedade civil. As acusações vão de leituras bíblicas distorcidas à denúncia de que essa teologia serve como plataforma para projetos de dominação política disfarçados de espiritualidade.

Uma das críticas mais recorrentes é que a Teologia do Domínio ultrapassa os limites da missão evangelizadora e discipuladora da Igreja, promovendo um projeto de poder que se aproxima de uma teocracia disfarçada. Ao propor a conquista de instituições seculares por cristãos, ela corre o risco de romper com os princípios de pluralismo, laicidade do Estado e liberdade religiosa.
Além disso, muitos estudiosos questionam a exegese dos textos bíblicos usados para justificar o domínio sociopolítico.
O uso da fé como base para agendas políticas tem gerado divisões profundas nas igrejas e na sociedade civil. O discurso dominionista, em muitos casos, promove uma visão binária e de guerra espiritual, na qual opositores ideológicos são vistos como inimigos espirituais. Isso compromete a ética cristã do amor, da misericórdia e da convivência com o diferente.
Transfere-se aí, a batalha espiritual que Paulo fala em Efésio 6 para o campo da carne e sangue – indo justamente na oposição clara do que o apóstolo argumentou, dizendo que nossa luta não é contra carne e sangue.
Em contextos políticos instáveis, essa teologia pode servir como base religiosa para o autoritarismo, legitimando lideranças populistas que se dizem ungidas para “restaurar a nação”. A retórica de “redenção nacional” frequentemente se mistura com nacionalismo e discursos excludentes.
Teólogos como N. T. Wright e Jürgen Moltmann defendem uma escatologia do Reino baseada em esperança, justiça e reconciliação, contrastando com a narrativa de dominação e controle que marca certas expressões dominionistas.
As vertentes contemporâneas da Teologia do Domínio demonstram sua força adaptativa e apelo estratégico entre os cristãos que desejam ver transformação na sociedade. No entanto, sua expansão sem discernimento teológico pode levar à distorção da missão da Igreja e à confusão entre Reino de Deus e projetos ideológicos humanos. A crítica acadêmica e pastoral é essencial para distinguir entre o legítimo engajamento cultural cristão e a tentativa de controle sociopolítico travestido de espiritualidade.
O núcleo problemático da Teologia do Domínio é sua fusão entre missão espiritual e conquista sociopolítica, uma tentativa de antecipar, por meios humanos e institucionais, a plenitude do Reino de Deus. Essa teologia incorre no erro de teologizar o poder, assumindo que, ao ocupar estruturas de governo, mídia ou economia com líderes cristãos, o Reino se manifesta automaticamente.
Contudo, essa visão ignora a tensão escatológica do evangelho — o “já e ainda não” do Reino — e substitui a lógica da cruz pela lógica da coroa. Ao fazer isso, compromete a natureza do discipulado, que é fundamentada no serviço, no amor aos inimigos e na renúncia ao poder como meio de transformação. O resultado é uma fé misturada com ideologia, uma espiritualidade que se presta a projetos autoritários, e uma Igreja que deixa de ser sinal profético para se tornar agente de hegemonia.
Prof. Gedeon Lidório
Teologia, Antropologia, Filosofia e Psicanálise
Instagram: @gedeonlidorio
E-mail: gedeon@lidorio.com.br
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