Do Éden ao Congresso: a teologia do domínio e a busca pelo poder cristão

Parte 3

A Teologia do Domínio deixou de ser um discurso teológico de nicho para se tornar uma força moldadora de práticas religiosas e estratégias políticas. Originalmente confinada a ambientes reformados e reconstrucionistas, ela foi amplamente absorvida por movimentos carismáticos e neopentecostais a partir dos anos 2000, ganhando contornos mais práticos e acessíveis. Essa expansão ampliou seu alcance — e suas implicações sociais e eclesiológicas.

O chamado Movimento das Sete Montanhas de Influência (Seven Mountains Mandate) teve origem nas ideias de Bill Bright (Campus Crusade for Christ) e Loren Cunningham (JOCUM), sendo posteriormente sistematizado por Lance Wallnau.

O projeto, na prática quer:

Montanha de Influência	Aplicação prática (explicada)
Governo	Incentiva a eleição e nomeação de cristãos comprometidos com valores bíblicos para cargos públicos, com o objetivo de moldar leis, políticas e decisões estatais conforme princípios cristãos. Defende a presença ativa na formulação de políticas públicas, rejeitando a neutralidade estatal em questões morais.
Mídia	Promove a criação e ocupação de espaços em meios de comunicação (TV, rádio, jornais, internet), buscando influenciar a narrativa pública e combater a “anticultura” percebida como secular, relativista ou anticristã. Visa pautar temas a partir de uma cosmovisão bíblica.
Educação	Propõe a reformulação de currículos escolares e universitários com base em valores cristãos. Defende a inserção de princípios bíblicos em conteúdos pedagógicos, o combate à ideologia de gênero e a criação de instituições educacionais cristãs que formem cidadãos segundo a fé.
Economia	Busca formar líderes e empresários que administrem recursos com ética cristã, promovam prosperidade sob princípios bíblicos e combatam a corrupção e a ganância. Envolve a ideia de que a bênção financeira é parte do avanço do Reino e que cristãos devem ter protagonismo econômico.
Religião	Incentiva a unidade entre as denominações cristãs em torno de uma missão comum de transformação cultural. Valoriza o avanço evangelístico estratégico e a expansão da influência e presença das igrejas em todos os setores da vida social.
Família	Defende a promoção de modelos familiares tradicionais (heteronormativos e patriarcais) como fundamentos essenciais para a estabilidade social. Envolve a reação a pautas progressistas e a criação de políticas públicas que protejam “valores da família cristã”.
Artes e Entretenimento	Estimula a produção de conteúdo artístico, audiovisual e cultural com mensagens inspiradas nos valores cristãos. Isso inclui música, cinema, literatura e teatro como ferramentas de evangelização e influência espiritual sobre a sociedade.

Nessa abordagem, a ocupação dessas "montanhas" é vista como um imperativo espiritual e estratégico, e não apenas como uma opção. O foco deixa de ser a simples presença cristã na sociedade e passa a ser a hegemonia cristã como expressão do Reino de Deus.

A proposta das Sete Montanhas encontrou terreno fértil especialmente entre igrejas evangélicas no Brasil, África e América Latina, onde a ideia de empoderamento espiritual coletivo se articula com contextos históricos de marginalização religiosa ou social. Essa vertente costuma associar-se à teologia da prosperidade, à guerra espiritual e ao discurso de “tomada de territórios espirituais”, formando uma teologia híbrida de conquista sociocultural.

Nos últimos anos, o Brasil tem testemunhado uma presença cada vez mais ativa de lideranças evangélicas no cenário político nacional, especialmente dentro do Congresso. Esse fenômeno tem sido impulsionado não apenas por motivações cívicas ou morais, mas por uma visão teológica específica: a crença de que os cristãos foram chamados por Deus para governar e influenciar as estruturas do Estado. Grupos e parlamentares associados à chamada “bancada evangélica” frequentemente expressam, ainda que nem sempre de forma explícita, elementos da Teologia do Domínio, ao defenderem que é missão da Igreja “resgatar a nação para Cristo” e promover políticas públicas baseadas em princípios bíblicos.

Essa atuação tem gerado impactos significativos no debate público, sobretudo em temas como direitos civis, educação, família e liberdade religiosa. Por um lado, muitos podem ver nisso uma forma legítima de representatividade democrática; por outro, tenho uma grande preocupação de que esse engajamento esteja sendo guiado não por uma ética de serviço, mas por um projeto de poder político e cultural, em que o cristianismo deixa de ser testemunho para se tornar hegemonia.

A presença de discursos dominionistas em campanhas eleitorais, pronunciamentos parlamentares e alianças estratégicas revela como o “Congresso” se torna, na prática, um novo campo missionário — não para evangelização no sentido clássico, mas para a implementação de uma cosmovisão cristã nas leis e políticas do Estado.

O assunto está rendendo, vamos para a parte 4 desse artigo. Espero você lá!

Prof. Gedeon Lidório

Teologia, Antropologia, Filosofia e Psicanálise

Instagram: @gedeonlidorio

E-mail: gedeon@lidorio.com.br

Site: www.gedeon.lidorio.com.br

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DREHER, Rod. A Opção Beneditina: Uma estratégia para cristãos no mundo pós-cristão.  - https://amzn.to/43ehQF3

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