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Aldeia Global em chamas.

Por Walber Guimarães Junior, engenheiro e comunicador.


Uma das mais famosas fábulas de La Fontaine discorre sobre o eterno conflito do gato com os ratinhos de um determinado local. Dizimados em doses diárias, o desespero exigiu uma assembleia dos ratinhos que, sob aplausos deliberou, como solução final, que se colocasse um guizo no pescoço do gato que denunciaria sua proximidade e daria tempo para que os ratinhos se defendessem. Perfeito!



Todos nós sabemos que a teoria aponta soluções inviáveis na prática e, neste caso, pela falta de um voluntário que efetivamente executasse a missão, dessa forma, mesmo de posse da solução ideal, o sofrimento persistiu pela incapacidade de implementar a solução ótima.


Em tradução livre, o mundo moderno não tem apenas um, mais dois inimigos; os gatões Jinping e o Trump, este que acaba de chegar ao lar, cheio de fome e disposição e, ainda mais preocupados os pequenos ratinhos, camundongos ou ratazanas, ainda que fortes e competentes, são incapazes de enfrentar qualquer um dos gatos e, na impossibilidade de agradar aos dois, precisam fazer suas opções e oferecer contínuas indulgências aos adversários poderosos, no limite da entrega dos dedos para salvar as patinhas.


Como os recursos são limitados, os gatões sabem que precisam administrar sua voracidade para não esgotar o estoque ou talvez seja razoável estabelecerem acordos entre si que dividam os ratinhos em suas áreas de influência, evitando um confronto direto entre eles, que pode ser desastroso par ambos, preservando, ainda assim, um bom padrão de alimentação para si.


Parece uma boa metáfora para nossa pequena aldeia global, agora no início de 25, com a entrada em cena do teatral Trump, voraz e ameaçador, o equilíbrio global está prejudicado, com todos os personagens sob pressão para se ajustarem à nova realidade. Ainda que sobrem restrições, a melhor alternativa parece ser apostar no entendimento entre os gatões chefes que, apesar de desenhados para os donos do pedaço, talvez seja a melhor alternativa para a população de ratinhos que terão que se ajustar à ração, ou às migalhas que estejam disponíveis.


Trump e Xi Jiping sabem que um ajuste entre ambos oferece espaço para que ambas as economias sigam dentro de parâmetros satisfatórios e apenas depois desta eventual acomodação, caberá aos ratinhos coadjuvantes, ainda que algumas economias pareçam robustas ratazanas, se ajustarem aos novos tempos. Algo muito mais previsível que uma guerra comercial aberta entre os líderes da Aldeia Global.


Embora o raciocínio lógico aponte este roteiro, a habilidade dos líderes maiores, apoiados por estratégias e técnicas eficazes de negociação, abre possibilidades para muitos cenários que, como é natural, alternam as variáveis que impactam as demais economias. Estas são as razões da tensão que incomoda todos os players do mercado mundial neste início de ano.


Acredito que nenhum dos cenários previsíveis sejam trágicos para o Brasil, embora, naturalmente algumas situações, como uma sobretaxa excessiva nas nossas exportações, possam gerar transtornos e dificuldades econômicas no curto prazo, todavia, as acomodações serão sempre possíveis para quem tem aquilo que todos querem; comodities com preços competitivos.


Ocorre que a economia entrelaça todas as variáveis, não sendo possível isolar completamente qualquer dos fatores, desta forma, se os EUA resolvem proteger excessivamente seus produtores, com altas taxas de importação, a consequência imediata será um aumento de preços internos que podem alavancar os índices de inflação internos, suficientes para promover estragos ainda maiores. Logo, embora muito eficiente como bravata, tão ao gosto de Trump, não há medida unilateral que não ofereça ônus em sentido contrário.


Ainda nesta linha, taxações no comércio China e EUA, pior cenário, não prejudica demais o Brasil porque aumenta nossa competitividade tanto nos portos chineses como americanos. Enfim, por mais agitadas que estejam as expectativas no curto prazo, após Trump impor uma posição de força, o segundo momento é de diálogo porque o acordo, mesmo não tão favorável, será melhor que o confronto.


Sim, a aldeia global está em chamas, mas depois da postura incendiária de Trump, até ele vai vestir o uniforme dos bombeiros e operar rapidamente para baixar a temperatura da economia mundial.


Infelizmente, o horizonte de várias outras questões de impacto para a humanidade seguirá nebuloso, como as demandas ambientais, o clima, os direitos humanos, dentre outros.


 Triste imaginar, de novo, os ratinhos debatendo em inúmeras assembleias, mundo afora, desenhando soluções engenhosas que, todavia, não envolve os gatões chefes do pedaço.


Enfim, quem conseguirá colocar o guizo nos gatões líderes da Aldeia Global?

 

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Nota do editor: os textos, fotos, vídeos, tabelas e outros materiais iconográficos publicados nos espaços “colunas” não refletem necessariamente o pensamento do bisbilhoteiro.com.br, sendo de total responsabilidade do(s) autor(es) as informações, juízos de valor e conceitos divulgados.