Por Walber Guimarães Junior, engenheiro e diretor da CIA FM.
Neste mesmo espaço, condenei a veemência com que Lula defendeu o presidente Maduro e a democracia venezuelana que só ele, em delírio ideológico, enxergava. Despertei a fúria de alguns petistas que contestavam minha capacidade de criticar o Lula, mais até que os argumentos oferecidos, e, em contrapartida, recebi os irritantes “eu avisei” de pretensos donos da verdade, muitos ainda apaixonados pelas sandices do capitão autoritário e antidemocrático.
Isto me faz pensar quais o limite da tolerância que segue testada em muitos países.
O mundo inteiro assiste a uma renhida disputa ideológica, com socialistas governando vários países importantes, Alemanha e Espanha, alguns se equilibram ao centro, como a França, e outros atendem a direita radical, como a Itália e a Polônia. Detalhe fundamental; cada vez a disputa tende à radicalização, com excessos e fakes news, como assistimos na nossa eleição.
Na França, Holanda, Suécia e Finlândia, movimentos de extrema direita são cada vez mais fortes e podem, em alguns anos, serem majoritários. Os sinais são preocupantes pela evolução dos movimentos radicais, mais de extrema direita, mas também de extrema esquerda, principalmente entre jovens, o que nos inquieta quanto ao futuro. O Brasil também funcionou como laboratório para mostrar a todos que a resposta à extrema direita não se acha no centro mais se deslocando também para a ponta esquerda.
As pressões migratórias, inevitáveis e crescentes em um mundo injusto, tendem a reforçar a xenofobia e o discurso radical. A tensão social sobe a níveis preocupantes em muitos países e a naturalização de ações radicais é também marca dos novos tempos em todo o mundo. Ofensas verbais transitam rapidamente para a violência física e transgressões, com o caso brasileiro bem emblemático desta evolução.
Quais os limites? Haverá um momento, enquanto possível, de retorno ao bom senso? Difícil responder porque mesmo aqui, onde os excessos provocaram até mortes, nada retrocedeu. Visivelmente, vivemos uma transição onde cidadãos comuns perceberam a nova relação de forças na sociedade, revitalizada pela era digital que colocou em campo milhões de pessoas que despertaram para a possibilidade de participação mais ativa e permite que pequenas transgressões individuais viralizem, estimulando novas ações como se fosse um game onde o desafio se populariza, exigindo que todos tenham seus santos e demônios cultuados com amor e ódio, em proporções diversas.
Todavia, percebo que em todos os lugares, o radicalismo histérico é reduzido, embora convincente, e a grande maioria se envolve apenas no movimento eleitoral. Este é o caminho para, sem limitar o debate ideológico, trazer civilidade a estas disputas. Impor o limite democrático, em qualquer circunstância para ser o parâmetro fundamental. Por isso, a posição de Lula foi detestável.
Felizmente, ele, por força das circunstâncias, teve que recuar. Em Bruxelas, nações reunidas condenaram a Venezuela e pedem eleições limpas, em moção assinada inclusive por Brasil e Argentina). Um aceno ao bom senso que permitiu que Lula retornasse ao campo democrático.
Em jogo, muito mais que ideologia, mas a governabilidade do Brasil que explica até a possibilidade de recondução de Aras à PGR que mostra o nível de concessões que Lula está disposto a fazer para garantir suas ações. Persiste ainda o debate sobre o limite das ações para garantir a democracia.
O STF tomou decisões heterodoxas (ou no mínimo menos ortodoxas) por conta da defesa da democracia. Pessoalmente, condenei os excessos do STF mas aplaudi a defesa intransigente da democracia. Não é incoerente minha posição? Qual o valor mais relevante e quem decide isto?
Atacam Alexandre de Moraes como se fosse um ato patriótico. É patriotismo ou apenas selvageria? Talvez seja a necessidade do famoso minuto de fama, somado ao raciocínio débil que define tudo que não está no seu campo ideológico é inaceitável.
O que se espera, neste momento, é que as forças não contaminadas com a polarização, mesmo que alinhadas, via voto, a um dos lados, perceba que o silêncio precisa ser rompido e se torna imprescindível a defesa da democracia e da civilidade.
Uma sociedade em guerra é terreno fértil para a radicalização e não temos tempo para perder com disputas irracionais. Temos pressa para recuperar o tempo perdido. A fome é uma missão mais urgente e só a recuperação da economia poderá prescindir das ações de socorro imediato, necessárias mas insuficientes para resgatar a dignidade de milhões que passam fome.
Sim, o fim da intolerância passa pela cobrança firme da grande maioria da sociedade que prefere o bom senso.
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